Dias 1 a 8


1º Dia - 21/03/2008
Curitiba – Camaquã, 887 km

   Após despedir-me de minha mulher com um aperto no coração saímos as 5:45 da manhã de minha casa em direção a cidade de Camaquã (RS), primeiro destino de uma viagem que planejei durante 1 ano e meio nos mínimos detalhes.

Era sexta-feira santa e tínhamos a preocupação de pegar movimento na estrada, mas felizmente apesar de haver muitos veículos o trânsito fluiu normalmente. O céu estava nublado e temperatura em torno de 16 graus. Paramos em Garuva para esticar as pernas e tomar café. Após 20 minutos seguimos viagem, vindo a parar em Itajaí para abastecer as motos.

Quando chegamos a Palhoça, onde termina a pista duplicada da BR-101 pegamos um pequeno engarrafamento em função do afunilamento da pista, aproveitamos para parar em um posto e tirar algumas roupas, pois já estávamos começando a passar calor. Deste ponto até a entrada para Torres (RS) a estrada requer o dobro de atenção do motorista, pois há trechos duplicados em ótimo estado, outros em obra e trechos nos quais onde não se sabe por onde está andando, se sobre a estrada, acostamento ou desvio. Falta sinalização e a pavimentação está irregular, com muitos buracos, areia solta e muitos caminhões (além dos que estão circulando existem os da obra cruzando a pista).

Nossa próxima parada foi em Laguna para abastecermos. Sem perder tempo seguimos para Araranguá, onde fizemos uma pequena pausa para lanchar (nosso almoço).

De Araranguá fomos direto para Torres, paramos no topo do morro do farol para que o Junior e minha cunhada vissem a cidade de cima. Em setembro do ano passado eu e minha mulher havíamos passado por lá e conhecemos uma cidade vazia, bem diferente do que eu estava vendo, o que era óbvio, pois era um final de semana prolongado. Descemos o morro e paramos no parque estadual da Guarita. Não fomos caminhar sobre as falésias pois as motos estavam carregadas e nós não estávamos com roupas apropriadas para isso.

Optamos seguir viagem pela Estrada do Mar até Osório, que apesar de ter vários radares sem dúvida é a melhor opção, pois não existem buracos, obras e nem caminhões. A estrada de Osório a Porto Alegre, conhecida como Freeway, é o sonho de todo o motorista, simplesmente perfeita. Passamos por Porto Alegre ao entardecer (sem entrar na cidade), e a imagem que ficou registrada da capital gaúcha foi muito boa. De lá seguimos até Camaquã, parando somente para abastecer em Guaíra. A BR-116 neste trecho é pedagiada (moto não paga) e está ótima, com “olho de gato” em toda a extensão. Chegamos ao nosso destino do dia as 21:10h, fomos direto a praça principal onde paramos para jantar. De lá nos dirigimos para o hotel, onde pudemos esticar o esqueleto e nos preparar para o dia seguinte no qual tinhamos como objetivo a cidade de Colônia Del Sacramento no Uruguai.






2º Dia - 22/03/2008
Camaquã - Montevideo, 794 km

        A nossa idéia era saírmos as 6:00 horas da manhã, mas nos atrasamos e acabamos caindo na estrada somente as 7:00h. Enquanto arrumávamos a bagagem caía uma chuva fina que incomodava. Apesar da chuva ter parado, a pista estava escorregadia e a medida que o sol ia esquentando a água do asfalto ela tornava-se um espécie de cerração o que dificultava bastante a visibilidade. Talvez por este motivo, próximo a Pelotas passamos por um acidente impressionante, no qual um Voyage (acho que era) estava literalmente partido ao meio e o caminhão somente com o parachoque amassado.

        Paramos para abastecer por volta das 8:00h e minha cunhada queria tomar o café-da-manhã, como o posto estava meio “derrubadinho” e achei cedo sugeri pararmos no próximo posto para lancharmos. Imagino que ela deve ter me xingado bastante, pois só fomos parar 240 quilômetros a frente em um posto pior ainda, após ter cruzado a reserva do Taim. Minha cunhada e meu parceiro de viagem comeram uns salgados que pingavam gordura, não tive coragem, ataquei umas bolachas que tinha no baú. A passagem pela reserva do Taim se dá por uma estrada em linha reta com 17 quilômetros e convidativa para acelerar, porém com velocidade máxima permitida de 60 km/h, pois o número de animais que cruzam a estrada é grande, claramente comprovado com as diversas capivaras mortas no acostamento.

        Abastecemos e seguimos direto para o Chuí, paramos para algumas fotos e entramos na cidade pois o Junior precisava passar no banco. Demos uma volta rápida pela cidade, que lembra muito Cidade do Leste no Paraguai (fronteira com Foz do Iguaçú), uma zona. Mal saímos da cidade e já paramos debaixo da placa “Bienvenidos a La Republica Oriental del Uruguay”. Fizemos todos os trâmites burocráticos que não levaram mais de 20 minutos e agora sim, estávamos no Uruguai.

        As estradas uruguaianas são impecáveis, sem buracos e com excelente sinalização. Para compensar os carros em geral são muito velhos e os motoristas são péssimos, não respeitam a sinalização, os outros carros e muito menos as motos. Saímos da estrada uns 7 quilômetros para conhecer um balneário chamado Punta del Diablo. O tempo estava nublado e com um vento intenso, por estes motivos o lugar que é bonito não chamou tanta atenção assim. O que mais chamou a atenção foi a quantidade de “cabeludos” e hippies no local, até parecia que havíamos voltado para o Woodstock. Ficamos uns 20 minutos e seguimos direto para Punta del Leste.

        Como era feriado a chegada da cidade estava bem tumultuada. Paramos no primeiro posto e ao abastecer tive meu primeiro problema com o cartão de crédito, que apesar de ser aceito naquele estabelecimento não estava passando. Isto aconteceu em muitos outros lugares, nos três países que passamos. Pelo que percebi o problema era pelo fato do meu cartão ser bem novo, com chip e as máquinas por onde passamos muito velhas. Quando a máquina era mais moderna o cartão funcionava. Felizmente estávamos preparados e não faltou dinheiro, só tivemos que fazer alguns câmbios a mais (converter dólares e reais em pesos). Confesso que em alguns momentos ficamos apertados, para se ter uma idéia saí do Uruguai somente com 60 pesos uruguaios (equivalente a R$7,20), do Chile e da Argentina sem nada (para não mentir com algumas moedas que guardo de recordação).

        Enfim, fomos conhecer o charmosíssimo balneário, o qual me surpreendeu, é muito mais bonito e rico do que eu pensava. A praia para o mar aberto não é tudo aquilo (provavelmente esta impressão causada pelo mau tempo), mas a parte interna.....

O atrativo da praia voltada para o mar aberto ficou por conta da mão enterrada, escultura em concreto de uma mão gigantesca enterrada, deixando somente os dedos de fora. Difícil foi tirar fotos, pois o vento jogava areia nas máquinas fotográficas e havia muita gente procurando um bom ângulo para ficar. Passamos pelas marinas e pelo centrinho (como já disse com trânsito muito tumultado). Paramos as motos e caminhamos um pouco pela rua principal com centenas de lojas de roupas e soufenirs. Aproveitei e entrei em um locutório para falar com minha esposa (segundo dia e a saudades já estava dando as caras). Escolhemos um restaurante e optamos por sanduíche gigantesco e delicioso, uma especialidade da casa. Na hora de pagar fiquei um pouco mais feliz, pois consegui usar pela primeira vez o meu cartão de crédito (a máquina era bem moderna, daquelas que trazem a mesa). Nos despedimos do garçom simpatissíssimo (motociclista também) e seguimos para Montevideo. A estrada dupla é maravilhosa, mas mais uma vez, os motoristas não.

Chegamos as 23:30h e fomos direto para o centro procurar um hotel. Vários hotéis estavam lotados e nós cansados aceitamos a indicação de um casal de gaúchos que estava passando o feriado em Montevideo. Segundo eles no ano anterior tinham ficado neste hotel que era bonzinho. Infelizmente confiamos em nossos conterrâneos e entramos pelo cano, o hotel era uma espelunca, mas o cançasso venceu forçando-nos a ficar. Feito o check-in entrei no quarto, tomei um banho e caí como uma pedra na cama.






3º Dia - 23/03/2008
Montevideo – Buenos Aires, 183 km

        Como mencionei anteriormente o objetivo final do dia de ontem era ir até a cidade de Colônia del Sacramento, aonde pegaríamos o Buquebus, um espécie de ferry boat. Porém como dormimos em Montevideo, tivemos que sair as 5:30 da manhã para chegarmos com folga a Colônia e pegarmos o Buquebus que sairia a 9:00h. A temperatura desta manhã não estava tão baixa (uns 12ºC), porém não estamos vestidos como deveríamos e passamos um pouco de frio.

        A estrada - como as demais no Uruguai - é um tapete, muito bem sinalizada e estava totalmente vazia, pois era cedo e um domingo de páscoa. Por este motivo passamos por vários postos de gasolina fechados e a conseqüência foi óbvia, pane seca. A XT faltando uns 50 metros para o fim de uma subida apagou. Paramos e fizemos o reabastecimento com a gasolina que estava em meu galão reserva, pois como o Junior estava com garupa ele ainda não tinha o seu “estoque”. Concluímos a subida da ladeira e para a nossa indignação havia uma seqüência de 4 postos de gasolina, todos abertos. Abastecemos e enrolamos o cabo (pra valer), pois já eram 8:30h. Nos últimos 50 quilômetros mantive a velocidade de 130 km/h e quando chegamos ao Buquebus fizemos uma constatação muito interessante, o marcador da XT neste mesmo trecho indiva que estávamos andando a uma velocidade de 140 km/h. Depois observando este fato mais atentamente percebemos que o odômetro também tinha uma diferença bem grande entre as duas motos. No total percorrido durante a viagem a XT “rodou” quase 400 quilômetros a mais que a Falcon. A minha conclusão é que a Falcon está correta, pois as indicações de distâncias nas placas e o odômetro batiam.

Independente de qual a velocidade que estávamos rodando, nós chegamos as 8:55h no portão de embarque e para nossa tristeza o barco estava lotado. A nossa idéia era pegar este barco pois ele custa o equivalente a R$72,00 por pessoa + moto. O tempo de viagem é de 3 horas. Porém como estava lotado tivemos que pegar o das 10:30h, o qual faz o mesmo percurso em 1 hora, pois viaja a 80 km/h. O catamarã é aluciante, muito grande, com poltronas confortáveis, ar-condicionado, lanchonete e free-shop. O problema é que custou R$135,00.

No barco o Junior pegou algumas dicas com um americano que estava retornando de El Calafate, enquanto isso, eu estava conversando com duas senhoras que estavam passando alguns dias em Montevideo e Buenos Aires. Elas eram de Ushuaia e donas de um hotel.

O passeio é muito bonito e o dia estava lindo, com um céu de brigadeiro. O visual da chegada a Buenos Aires impressiona pela beleza das construções. O catamarã aportou em Puerto Madero e já na saída nos foi solicitado as documentações (Carta Verde, autorizações, etc) que graças aos nossos preparativos estavam todas em ordem. Passeamos pelo Puerto Madero, que é um bairro com marinas, restaurantes, calçadões e prédios moderníssimos. Difícil de acreditar que isto era um porto a algumas décadas. E como em todo lugar a região em torno de portos não é nada bonita.

Durante os preparativos havia montado uma lista com o endereço de inúmeros albergues e com base nela fomos a “caça” de um local para ficar. Com os endereços e o mapa que tinhamos de Buenos Aires e com o meu pequeno conhecimento da capital argentina foi fácil de circularmos pela cidade (estive por 12 dias a trabalho em Buenos Aires em 2004). Óbvio que os motoristas argentinos faziam de tudo para dificultar, eles em geral são loucos ao volante. Durante a procura que nos tomou uns quarenta minutos encontramos um hotel no centro, muito antigo, mas bem conservado, confortável, com garagem e com preço acessível. Após devidamente acomodados e de banho tomado fomos para a Recoleta.

A Recoleta é outro lugar que merece destaque na capital argentina, pois da mesma forma que o Puerto Madero, foi recuperado. A região é um conglomerado de restaurantes, bares e lojas de soufenirs em volta a um cemitério. Muito gostoso de caminhar despreocupadamente, lugar para turista mesmo. E finalmente por volta das 5 da tarde fomos almoçar no Hard Rock Café. De lá caminhamos por algumas praças e vimos muitos monumentos e esculturas. A noite passeamos pela rua Florida, um calçadão com muitas lojas e manifestações de arte popular. A soma de tudo que vimos reforça o meu sentimento sobre Buenos Aires, uma cidade fantástica, pelo menos a região central.








4º Dia - 24/03/2008
Buenos Aires - Ascasubi, 737 km

        Nos despedimos da Claudia (minha cunhada), que pegaria o avião no final da tarde para retornar para Curitiba e as 6:45h estavamos com as motos ligadas. Na saída acabamos passando reto pelo acesso a autopista que nos levaria a ruta nacional 3 , mas o erro até que foi positivo, pois pudemos passar em frente da La Bomboneira, estádio de futebol do Boca Juniors, além de nos levar direto ao Caminito, que não tinha visto graça quando o visitei em 2004 (confirmei, não tem a menor graça o que é estranho, pois todo turista que vai lá gosta). Abastecemos, tomamos um café da manhã e pegamos a autopista que nos levou direto para a ruta 3.

Depois de tudo que li sobre a ruta 3, que faríamos de ponta-a-ponta, eu tinha uma imagem de uma estrada totalmente deserta, porém o que vimos neste primeiro dia de viagem não foi isso, confesso que fiquei decepcionado. Para ajudar dia 24 de março é um feriado nacional na Argentina, é o dia da Misericórdia que comemora o fim da ditadura. Resumindo, era um feriado de quatro dias e todo mundo que podia estava nas estradas. Para completar os agricultores estavam promovendo uma paralização que contava com mais de 1300 piquetes por todas as estradas do país. Os piquetes eram pacíficos e impediam a passagem de todos os caminhões que levavam alimentos para a capital. O objetivo era deixar Buenos Aires sem comida para forçar o governo a renegociar os impostos que incidem sobre os produtos agrícolas. A causa era nobre mas gerava um pouco de engarrafamento, que nos atrasou ainda mais.

Em Cachari (242 quilômetros de Buenos Aires) paramos para abastecer junto a um destes piquetes. Lá nos indicaram a mudar a nossa rota, pois na ruta 3 teríamos vários piquetes e muito trânsito. Seguimos o conselho e pegamos as rutas 226, 76 e 51 e com isso pegamos um único piquete e o mais interessante, reduzimos o trajeto em 70 quilômetros.

Na interseção entre as rutas 76 e 51 paramos para abastecer (município de Hinojo) e lá tivemos que ter muita paciência. Era troca de turno e o sistema do posto parou de funcionar, com isso perdemos mais de 40 minutos. Não podíamos ir em frente sem abastecer, pois segundo os nossos mapas e informações dos frentistas o próximo posto seria somente em Coronel Pringles 162 quilômetros a frente, distância que não conseguiríamos cumprir sem abastecer. Finalmente com os tanques cheios seguimos viagem por estradas bem pavimentadas e com plantações de girasois de ambos os lados da estrada - uma pena que não estavam floridos.

Já próximo a Bahia Blanca passamos por uma represa chamada Passo de La Piedra, a qual abastece a cidade. Na região sul do Brasil esta represa não chamaria a atenção, mas após um dia inteiro de viagem sem ver um único filete de água a represa se torna linda. Chegando ao centro da cidade demos de cara com mais um protesto que fechava várias ruas.

O nosso planejamento previa que dormiríamos em Viedma, o problema é que ainda faltavam 280 quilômetros, e já eram 19:00 h, as estradas estavam lotadas com as pessoas retornando para as suas casas em final de feriado e nós cansados. Mesmo com este quadro resolvemos continuar um pouco mais e fomos presenteados por um luar magnífico que iluminava a estrada. Já na saída de Bahia Blanca fomos parados pela primeira blitz, era da vigilancia sanitária. Os guardas foram muito cordiais, só nos deram um pouco de trabalho, pois pediram para abrir os alforjes e o baú, mas como não tínhamos nenhuma fruta ou verdura, fomos liberados. Pilotamos por 110 quilômetros e resolvemos dormir num hotel junto a um posto de gasolina na cidade de Ascasubi. Estávamos podres a ponto de comprar alguns salgados na loja de conveniência do posto e “jantar” no quarto.





5º Dia - 25/03/2008
Ascasubi – Puerto Madrin, 691  

        As 5:30h levantamos, colocamos as coisas nas motos e começamos um novo dia de viagem com o sol  nascendo entre as nuvens que nos rendeu boas fotos. Passamos por Viedma onde fomos novamente parados por um guarda, só que desta vez por um policial caminero ou vial (equivalente a nossa polícia rodoviária). Ele nos pediu documentos, perguntou para onde íamos, disse para nos cuidarmos e desejou-nos suerte (modo como os argentinos desejam boa viagem). A partir deste ponto da viagem a ruta 3 passou a ser o que eu tinha em mente, longas retas e poucos carros. Para se ter uma idéia marquei algumas distâncias: 56 quilômetros de reta, 2 curvas, 65 quilômetros de reta, 1 curva, 92 quilômetros, 1 curva e outra reta....... e assim por diante.

Ao meio dia paramos em San Antonio do Oeste para abastecer, almoçar (leia-se, lanchar) e trocar o óleo das motos. Abastecer e almoçar foi fácil, já para achar uma oficina para trocar o óleo nem tanto, pois não existem oficinas de moto na cidade. Acabamos parando num lugar chamado El Aceitoso, que é onde se troca o aceite (óleo) de veículos. Este é um ponto interessante, os postos de gasolina (chamados de estación de servicio) não trocam o óleo e nem possuem funil, item que nos fez falta em vários momentos da viagem. Uma conseqüência de existirem pouquíssimas motos é a falta de experiência do mecânico em trocar o óleo das nossas motos. Resumindo, acabamos dando todas as diretrizes para que o serviço fosse bem feito.

Duas horas depois da chegada a cidade nos direcionamos a um balneário bem próximo da cidade e a 5 quilómetros da ruta 3. O lugar chama-se Las Grutas e é muito bonito, valendo o pequeno desvio. Na saída de Las Grutas fomos parados por outra blitz da vigilância sanitária e mais uma vez o guarda foi muito educado. Desta vez nem precisamos mostrar a bagagem.

Próximo das 16:00h paramos no trevo que dá acesso a Península Valdez e após uma pequena conversa saímos em direção a este patrimônio natural da humanidade, mesmo sem estar no nosso planejamento de viagem. Sabíamos que para conhecer o parque são necessários no mínimo dois dias, por isso fizemos um pedaço bem pequeno da península e assim mesmo pudemos ver o quão bonita é. Pela primeira vez alguns carneiros com chifres enormes, guanacos, nhandus e lebres cruzaram o nosso caminho. Também pela primeira vez tivemos contato com o rípio, que estava muito solto e perigoso. Neste trecho foi a vez do Junior comer pó, e diga-se de passagem, muito pó.

Após percorrer 691quilômetros chegamos a Puerto Madrin, onde pernoitamos em um albergue muito ajeitado (El Gualicho Hostel). Fizemos um pequeno city tour (a pé mesmo), jantamos um pizza e fomos dormir.




6º Dia - 26/03/2008
Puerto Madrin – Puerto Julian, 871 km

Após o café da manhã saímos para um city tour (agora de moto), tiramos algumas fotos na beira mar e pé na estrada, ou melhor, pneus na estrada.

Este dia de viagem foi um tanto monótono, basicamente vimos muitas retas, deserto de ambos os lados e a escasses de cidades, foram muitos quilómetros sem civilização. A excessão foi a cidade de Comodoro Rivadávia, que é grande e bem desenvolvida (para os padrões da Patagônia), provavelmente por conta do petróleo. Lá pude ver os cavalos-de-pau, como chamam as bombas para retirar petróleo da terra. Próximo a um destes cavalos-de-pau vimos vários desenhos feitos em baixo relevo no chão com uma simetria perfeita, bem no estilo do filme Sinais de Steven Spilberg. Eles tinham uns 10 metros de diâmetro. Ficamos observando e tentando entender o que eram, mas saímos de lá sem explicações lógicas para aquilo.

Uma coisa interessante (que se repetiu mais vezes durante a viagem) é que segundo os nossos mapas uma das paradas que faríamos para abastecer seria Uzcudun e para a nossa surpresa a “cidade” representada no mapa se resume somente a um único posto de gasolina. Lá encontramos um casal de holandeses que estavam fazendo a América do Sul em um Toyota 4x4 com barraca no teto.

A partir deste dia de viagem o preço da gasolina baixou significativamente em função da isenção de um dos impostos que insidem sobre a gasolina. Esta é uma das ações do governo Argentino (a única que vimos) para aumentar a densidade demográfica da Patagônia. Os preços variavam entre R$0,91 e R$1,10, uma beleza!!!!

Fora estes fatos o resto do dia posso resumir como retas e mais retas e uma paisagem plana a perder de vista.




7º Dia - 27/03/2008
Puerto Julian – San Sebastian, 641 km

Neste dia saímos um pouco mais tarde, por volta das 7:00h. Foi o primeiro dia de frio, algo em torno de 6 ºC. Fizemos um city tour e pudemos, pela primeira vez, ver lembranças da guerra das Malvinas que ocorreu em 1982. Constatamos também que os argentinos não admitem ter perdido a guerra e para eles Las Malvinas son argentinas (slogam  visto por todos os lados). Para se ter uma idéia, os jornais até mostram a previsão do tempo das ilhas como se fossem mais uma província argentina. Os mais desinformados podem até se confundir e realmente acreditar que os ingleses abandonaram as ilhas.

Enquanto o Junior estava no banheiro parou um senhor, Guillermo Godoy de 75 anos em uma V-Strom amarela. Ele havia saído de Florianópolis a um mês iniciando uma viagem que passará por praticamente todos os países das Américas, incluindo a Antártica e o Alaska. Tiramos algumas fotos e trocamos algumas dicas, ou melhor, recebemos, afinal ele já percorreu mais de 1.250.00quilômetros de moto por todos os continentes. Só para a Patagônia já tinha ido 11 vezes. Ele nos assustou um pouco, pois disse que todas as vezes que passou pela rota 40 havia levado um tombinho, mas mesmo assim disse que não era para desistirmos de passar por lá, só disse para ter cuidado redobrado.

Neste dia encontramos o primeiro rio desde Bahia Blanca que ficou a 1800 quilômetros para tras. Junto ao rio esta localizada a cidade de Comandante Piedra Buena, muito bonita, parece até maquete. Após 230 quilômetros de retas chegamos a Rio Gallegos, uma cidade relativamente grande, tem até alguns prédios! Almoçamos em um posto de gasolina (lanche para variar) e seguimos direto para a fronteira que fica poucos quilômetros dali.

Estávamos um pouco apreensivos com a alfândega chilena, pois muitos relatos que li informavam que são bem criteriosos. Felizmente tudo correu bem. Perdemos uns 30 minutos, pois pegamos uma filinha (um ônibus parou na nossa frente com uma galera para acertar a documentação). Feito a parte burocrática o guarda solicitou para abrirmos os alforjes e o baú a procura de drogas e alimentos não industrializados e fomos liberados. Tiramos algumas fotos na placa de entrada (não poderia faltar) e seguimos direto para Punta Delgada onde pegaríamos a balsa para cruzar o Estreito de Magalhães.

Enquanto esperávamos a balsa chegar, o que levou uns 20 minutos, tiramos algumas fotos e tentamos pagar o transbordo, porém nos disseram que o pagamento deveria ser realizado dentro da balsa (que mais parece um navio). Assim que chegou fomos os primeiros a entrar e subimos na parte mais alta do convés para apressiar a paisagem, que deve ser o dia todo bonita e naquele horário estava mais linda ainda por conta do pôr-de-sol. Tentamos mais duas vezes fazer o pagamento aos tripulantes da embarcação e não foi possível – confesso que não fiquei nem um pouco triste com isso. Ao sair da balsa pegamos um trecho de 40 quilômetros de asfalto até a cidade de Cerro Sombrero, onde abastecemos e ficamos alguns minutos no posto ponderando para ver o que seria melhor, dormir ali ou andar 110 quilômetros de rípio e pernoitar em San Sebastian (cidade chilena na fronteira com a Argentina). Optamos por seguir afinal ainda eram 19:00 horas.

Demoramos um pouco para nos adaptar ao rípio que em praticamente todo este percurso estava bom. Após os quilómetros iniciais pudemos manter a velocidade entre 40 e 70 km/h e com isso chegamos a fronteira as 22:00 horas. No meio do caminho fizemos uma parada para esticar as pernas e quando apagamos as luzes das motos (longe de qualquer civilização) pude ver um céu estrelado como nunca havia visto antes com uma quantidade de estrelas impressionante.

Ao chegarmos em San Sebastian (CH) ficamos boquiabertos, pois a cidade se resume a um hotel (muito feio por fora) e a fronteira. Estava ventando e o friozinho estava apertando (uns 6ºC). Entramos na aduana e confirmamos que “cidade” mostrada no mapa era somente aquilo ali. Perguntamos se a San Sebastian que fica do lado argentino era maior e o policial nos informou que sim. Fizemos a aduana chilena, que foi muito tranquila e seguimos mais 15 quilômetros até a aduana argentina. Ao entrar perguntamos sobre hotel na cidade e novamente ficamos boquiabertos, pois a San Sebastian argentina só era maior porque tem um posto de gasolina junto ao hotel e mais nada. O guarda nos informou que o hotel era bom e custava 80 pesos para os dois. Fizemos os trâmites burocráticos e fomos direto para o hotel. O proprietário vendo a nossa cara de cansado, o horário (23:00h) e sabendo que o próximo hotel estava a 180 quilômetros dali, pediu 150 pesos pelo quarto. Choramos um pouco e não teve jeito, tivemos que pagar. Bom, pelo menos o hotel era muito confortável, limpo e com calefação. Dormi muito bem e posso dizer que valeu a pena pagar, mesmo sabendo que estávamos sendo explorados.









8º Dia - 28/03/2008
San Sebastián - Ushuaia, 295 km

        Como iríamos rodar muito pouco neste dia acordamos mais tarde e tomamos café da manhã no hotel com vista para o mar o que veio a provar que os 150 pesos valeram a pena. Abastecemos as motos e seguimos até a cidade de Rio Grande, onde paramos para tirar fotos de uma parada militar que homenageava os que perderam a vida na guerra das Malvinas. Na saída da cidade abastecemos e o frentista “lavou” a minha moto, acredito que foi mais de 1 litro de gasolina para fora do tanque.

        Ao voltar para a estrada estava cada vez mais difícil conter a ansiedade, pois já conseguíamos ver a cordilheira no horizonte e a vegetação naquela região é diferente de tudo que eu havia visto até aquele dia. Ao chegar na cidade de Tolhuin passamos pelo lago Fagnano e depois pelo lago Escondido, um mais bonito que o outro. Faltavam menos de 100 quilômetros para chegar a um dos objetivos da viagem e começamos a atravessar o Passo Garibaldi, que é a passagem mais austral da cordilheira. Ao chegar no ponto mais alto paramos em um mirante para tirar fotos da cordilheira e do lago Escondido (visto de cima), que vista!

Um pouco antes de subirmos nas motos encontramos um alemão que estava indo do Ushuaia para o Alaska, e de bicicleta. Ele o seu parceiro que encontramos alguns minutos depois já haviam feito a Europa pedalando e pretendiam chegar no Alaska em três anos. Fiquei me perguntando, vivem do que? Como arranjam grana? Não tem família? Bom, também não tenho nada a ver com isso, só o que tenho a dizer é boa viagem.

Iniciamos a descida e a paisagem era a cada quilômetro mais bonita. Rapidamente chegamos a famosa placa de entrada da cidade - “Ushuaia – Bienvenidos a la Ciudad mas Austral del Mundo”. Tiramos várias fotos (obviamente) e fomos direto para o centro de informação para escolher um albergue. Optamos em ficar no Los Lupinos, bem próximo do centro e muito bom. Tomamos um banho relaxante e fomos passear pela cidade, a pé pois o centro é pequeno, porém muito movimentado e com muitas lojas e restaurantes. É um paraíso para compras, principamente de artigos de inverno, como luvas, botas, jaquetas e até eletrônicos.

Como estava fazendo praticamente todos os dias fui a um locutório e liguei para minha mulher, que a cada momento, mais falta fazia. Enquanto planejava a viagem não imaginava que sentiria tanta falta, pois todos os dias eu teria inúmeras novidades pelo caminho. Sabia que o peito iria apertar, mas não tão cedo, só era o oitavo dia de viagem num total de 24.

Após mais algumas caminhadas entre lojas e restaurantes não resisti, comprei uma máquina fotográfica que já estava paquerando antes da viagem, mas que havia desistido de comprar pois já iria gastar bastante durante a viagem. O valor pago foi o mesmo do Brasil, porém em pesos, ou seja 40% mais barato (no cambio daquele dia) – um bom negócio.

Para o jantar escolhemos o restaurante Tia Elvira, que fica de frente para o canal Beagle. O restaurante é muito aconchegante e serve o prato que procurávamos, a Centolla, que é um carangueijo gigante (quase um metro). É muito gostoso, porém apesar de um prato bem servido ele não satisfaz, serve apenas como entrada. Mesmo sendo relativamente caro (75 pesos) fale a pena provar, visto que esta iguaria dificilmente será encontrada no Brasil. Para completar o jantar pedimos badejo ao molho Rockeford, uma delícia! Quando estávamos saindo do restaurante vimos uma BMW com placa do México, entramos novamente no restaurante. Ele havia saído do México em um grupo de nove motociclistas, porém só três chegaram, os demais desistiram pelo caminho. Da mesma forma que o Guillermo (aquele brasileiro de Floripa com V-strom que encontramos dois dias antes) todos os integrantes do grupo que passaram pela rota 40 conheceram o rípio bem de perto - mais do que gostariam. Por sorte ninguém se machucou. Ele nos mostrou as “cicatrizes” que ficaram na BMW – nada muito sério. Como o nosso retorno era por esta rota, confesso que estava ficando preocupado, para não dizer apavorado.